terça-feira, 26 de outubro de 2010

UM POUCO DAS CONFISSÕES DE ENEIDA...






ENEIDA: A única coisa que posso, quero e vou confessar é que não nasci com amarras nos pés nem na alma... Sempre tive despejada dentro de mim a imensidão do mundo... Eu não cabia num só lugar e por isso jamais admitirei ser condenada...

As posturas das outras duas mudam. Elas se tornam pesarosas.

LEMBRANÇA: Não te dói pensar no que deixaste para trás?

ENEIDA 03 (lutando para controlar a emoção): A vida toda eu só tive dentro de mim a dor imensa de querer o que estava a minha frente...

MEMÓRIA: E a tua frente, em momento algum, projetava-se a imagem do que havias abandonado...

ENEIDA 03: Eu nasci abandonada à condição de romper prisões...

LEMBRANÇA: E, ainda assim, a vida só te destinou grades...

MEMÓRIA: Grades e mais grades...

ENEIDA 03 (tapando os ouvidos e baixando a cabeça): Não... Fere-me lembrar...

Numa nova mudança de postura, as outras duas tiram de seus bolsos algemas e partem de novo para cima de ENEIDA. Elas tentam pegar os punhos da personagem principal, mas ele resiste se esquiva

MEMÓRIA (impiedosa): Foi o que viveste... Tens que descer a esse porão...

ENEIDA (lutando para escapar): A dor ainda é muita... Não quero...

LEMBRANÇA: Querer? O querer não é liberdade que te pertença mais. Tua cadeia é o ter... Ter que reviver...

ENEIDA (debatendo-se): Não quero... Não quero...

MEMÓRIA: Mas tens...

As duas torturadoras põem as algemas nos punhos de ENEIDA 03 e nos seus próprios. As três, então, ficam atadas uma a outra. A atriz que faz ENEIDA 03 fica no centro. As luzes baixam e se inicia um novo jogo. Numa dinâmica angustiante, as atrizes que estão nas extremidades começam a puxar ENEIDA ora para um lado, ora para o outro. Letárgica, ela se deixa ir para lá e para cá. Parece alguém que apanhou e está enfraquecida. Inicia-se, portanto, uma sequência inspirada na crônica COMPANHEIRAS:

LEMBRANÇA: Éramos vinte e cinco mulheres presas políticas numa sala da Casa de Detenção, Pavilhão dos Primários...

MEMÓRIA: 1935, 1936, 1937, 1938...

LEMBRANÇA: Quem já esqueceu o sombrio fascismo do Estado Novo com seus crimes, perseguições, assassinatos, desaparecimentos, torturas?

MEMÓRIA: Vinte e cinco mulheres, vinte e cinco camas, vinte e cinco milhões de problemas...
TRECHO DA DRAMATURGIA DE "EU ME CONFESSO ENEIDA", OBRA VENCEDORA DO PRÊMIO CLÁUDIO BARRADAS. EM BREVE NOS PALCOS.

domingo, 24 de outubro de 2010

A RIBALTA JÁ PEDE AS CONFISSÕES DE ENEIDA



Registros do ensaio aberto do espetáculo EU ME CONFESSO ENEIDA.



Dramaturgia minha. Direção geral de Edson Chagas.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

O PONTO DE VISTA DIRETO E CONTUNDENTE DE MATEUS MOURA

Segue abaixo texto sem rodeios do jovem cineasta Mateus Moura. Opinião nua e crua sobre o nosso Ópera.

Esses viados são uns filhos da puta!

Mateus Moura

Sempre pra escrever de teatro eu penso 2 vezes, não conheço muito da História da Crítica ou mesmo da História do Teatro. Mas decidi pelo menos registrar minha admiração pelo musical que assisti na semana passada no Teatro Cláudio Barradas.
Esse blog pode parecer meio machista às vezes, e às vezes realmente o é, mas que fique registrada a minha admiração pelos gays, no campo da arte principalmente, mas também em todos os outros campos. Tem uns viados que são fodas.

O Dirty Harry falava que ele não tinha preconceito: ele odiava todo mundo... ensinou o meu caminho da libertação: desconfio de todo mundo. Outro dia, de frase em frase, chegou-se no dito, que em breve será popular, que “toda relação é bissexual”. Duvido alguém discordar – é fato: todo mundo é masculino e feminino.

O OPERA PROFANO, dramaturgia do Carlos Correia Santos, dirigido pelo Haroldo França e o Guál Dídimo, só não deve ter os músicos de homossexuais – entretanto sabemos que a música é a mais feminina das artes, e como o Ramon Rivera e o Armando Mendonça fizeram uns arranjos geniais, temos certeza que este lado é realmente aflorado neles, não há dúvidas.

Não me entendam mal os aponta-dedos da sociedade, não to mal-falando ninguém, pelo contrário, to tentando estabelecer o lugar cínico da arte na guerra dos sexos.
Quem tentar procurar defeito no OPERA é um enrustido! Um diamante é lapidado a cada ensaio. Um diamante concebido por Carlos Correia, dirigido por Haroldo e Guál, musicado por Ramon e Armando, e encenado por um grupo de atores iluminados.
To falando de inteligência de construção, sensibilidade poética, trabalho coletivo – é quase como o Círio: profano, sagrado, erótico, sublime, vulgar, belo, pesado, leve, tradicional, revolucionário, poderoso, suave. É uma opera!

Atmosferas.

As cenas cômicas são extremamente bem colocadas (corajosas). Mas foram as dramáticas que me marcaram: o estupro das sombras foi uma das coisas mais lindas que eu já vi, e a mise-en-scène do imenso bloco final me fez levantar da cadeira de tão esplendorosa: o quadro de Baby – o profano ser – nos braços – como Pietá – da escória; a santa com foco de luz próprio em primeiro plano, a entrada da Trindade, o ritual de benção; o que tenho a dizer é uma só palavra: Conseguiram.

OPERA PROFANUM.

No epílogo: a navalhada.

Se esse espetáculo não rodar o mundo, ele é realmente injusto. Vida longa...

A VISÃO DE ORLANDO SIMÕES PARA O PROFANO SER

Abaixo, novo texto sobre o espetáculo ÓPERA PROFANO. A opinião crítica agora é de Orlando Simões e foi baseada na apresentação de estreia da peça. O texto foi publicado no site Ponto Zero

Ópera Profano: Redenção...

É impossível existir um paraense que não viva os dois lados das celebrações do Círio de Nazaré, uma das maiores manifestações da fé católica no mundo todo. Claro que falo do lado sagrado e do lado profano da manifestação, não só de fé, mas de cultura também. No teatro não poderia ser diferente.

Vamos por partes. A primeira delas é desmistificar a palavra profano como sendo algo ruim, péssimo e pervertido. Profano é tão somente aquilo que está fora do templo religioso, em frente ao local de adoração, um assunto que não é religioso simplesmente é profano, não é ruim, amaldiçoado, só não é religioso como falar de moda, de sexo, de futebol, de festas, de dança, simplesmente profano. Claro, ao longo dos anos a palavra se impregnou de mais sentidos e todos pejorativos e carregados de carga negativa, entretanto profano é tudo aquilo que fazemos que não está dentro do sagrado, dependendo do que seja esse sagrado.

Talvez a melhor síntese para descrever o espetáculo teatral-musical Ópera Profano seja a síntese representada pela palavra metáfora. Metáfora entre vida e morte, luz e trevas, salvação e perdição, pecado e redenção, sagrado e profano. Eis aí a revelação que todos nós procuramos a vida toda e só nos chega nos momentos finais. A vida desperdiçada com os excessos da carne, com o corpo, com a matéria e com o excesso de profano... Veja: não só o profano pelo profano, mas o excesso de tudo que separa o corpo e a alma do sagrado, do santo, do divino, da luz, da salvação.

Em cena, a iluminação dramática cai como um fardo sobre o elenco que se rasteja abatido por ser composto de seres marginalizados, não criminosos, mas aqueles que vivem à margem da sociedade, do mundo, à margem de qualquer possibilidade de redenção, de perdão ou de auto-salvação. Luz e som são outros dois personagens em cena, sobem ao palco e dão seu show em cada pequeno ato que conta a história íntima e secreta das vidas desses personagens que já perderam tudo e todos e apenas uns nos outros se encontram e se identificam. No espetáculo não há a personificação do herói clássico e sua perfeição, só há personagens comuns, frágeis, imperfeitos, pecadores, marcados pelo peso da vida, pelas angustias e erros do passado e cada pequena história deste passado é uma resposta para o presente sórdido que se desenrola no cine Ópera, palco da trama e que abriga os personagens Tota, Baby, Mira, Lucas e Ângelo. Cada um derramando seus pequenos mundos e revelações sobre o público.

Em uma jogada de mestre, o próprio título da peça é uma grande metáfora entre a encenação musical da ópera e o cinema de filmes eróticos, Ópera, exatamente em frente à Basílica de Nazaré... Lembrem-se, profano, do lado de fora: Ópera Profano.

Luz e som são outros dois personagens em cena, sobem ao palco e dão seu show em cada pequeno ato que conta a história íntima e secreta das vidas desses personagens que já perderam tudo e todos e apenas uns nos outros se encontram e se identificam

Encontros e desencontros A solidariedade é uma das lições deixadas para nós...

O local onde o divino deveria se ausentar é onde se faz ainda mais presente a necessidade de salvação, onde há o pecado e a perdição, lá reside a necessidade de haver o encontro com o divino para expurgar pecados na superfície das almas ou nas suas mais escuras profundezas. É na presença inevitável da morte do travesti Baby que Tota furta a imagem da Virgem de Nazaré antes da transladação no sábado que antecede o Círio, deste ponto em diante tudo em cena é sagrado e profano, é pecado e redenção para cada pequena vida que se apoiava na luxúria, na raiva, na cobiça, na vaidade. Personagens à margem sim, mas que estão sempre ao alcance de nossa visão e tão humanos quanto qualquer um de nós. Demasiado humanos.

Redenção e salvação é um direito inegável para todos nós...Não há em Ópera Profano alivio para o peso dramático da morte que se aproxima do travesti Baby, sempre pontuada por visões do passado de cada criatura em cena, mas é na figura de Tota que reside alívio cômico, esperança, glamour e a vida resistente e persistente para roubar a imagem sagrada, levar até o local profano num gesto de amor e piedade pelo amigo, é na figura do deus ex machina das três personificações e seus questionamentos que entendemos o que levou tudo isso a ocorrer numa joga de mestre que desnuda de leve para o espectador a razão de se adentrar o Ópera Profano.

Brincar com as metáforas da luz e da música, jogar com o sagrado e o profano na festa do círio, é levar para onde está tudo perdido a oportunidade de salvação e deixar pairando sobre nós o fato de que a salvação é, sim, para todos nós, principalmente para aqueles à margem de todos os mundos.

No choque das histórias, das palavras, das ofensas e da violência contra o corpo e a alma o espetáculo se estende em suas melodias e sem percebermos toda essa violência dá lugar ao melancólico, ao triste, ao vazio e descobrimos que é no passado que habitam as respostas e as perguntas de cada infeliz criatura sob o teto do Ópera Profano. De história em história até chegarmos ao fim derradeiro de uma história que se repete diariamente nas vidas de milhões de devotos que são esquecidos pelo mundo carnal, mas eternamente lembrados pelo mundo do espírito e da alma. A lição que fica é a de que o perdão e a paz de espírito não são para uns poucos privilegiados, ambos são para todos.

Sobrevoa-se tanto o belo que se esquece que o horror também necessita de sobrevôos. Metáforas, ao contrário da salvação, não são para todos.

Fecham-se as cortinas.

Orlando Simões

É Designer de produtos e gráfico, desenhista e amante de Semiótica. Colunas de Design, Games, Quadrinhos, Literatura, Artes Cênicas, Cidade, Tecnologia e Cinema.


(http://www.pontozero.net.br/cenicas_operaprofano.php)

sábado, 16 de outubro de 2010

UM OLHAR DE POESIA SOBRE O PROFANO

Reproduzo, abaixo, texto com análise crítica sobre "Ópera Profano". O artigo, assinado pelo crítico Helder Bentes, foi publicado no Portal ORM. Foto de divulgação: Pedro Ferreira.

NOSSA SENHORA DE NAZARÉ É ROUBADA

Helder Bentes

“O eterno embate que não cessa de seduzir o sagrado e o profano encontra em Belém do Pará uma instigante estação. Nada mobiliza mais a maioria do povo paraense que a secular manifestação do Círio de Nossa Senhora de Nazaré. Um ritual de devoção que dita costumes, fascina milhões e acaba se transformando num autêntico espetáculo de fé. Posto quase em frente à Basílica de Nazaré, ajoelhado num ponto nobre do percurso das principais romarias da festividade, um cinema vem há décadas desfiando um cortante rosário de polêmicas. Dedicado à exibição de filmes de sexo explícito, o Cine Ópera é um grito mudo de inquietações que assiste diante de si o cortejo do divino. O que aconteceria se a imagem da Virgem Padroeira, a mesma que segue nas procissões do Círio, desaparecesse e surgisse dentro do Cine Ópera? Essa é justamente a partitura da trama ora apresentada”.

Assim começa a narrativa poética batizada como 'Ópera Profano', pela genialidade do paraense Carlos Correia Santos. A trama acontece dentro do Cine Ópera, cuja programação exibe filmes pornôs e atrai devotos da concupiscência da carne. As personagens são a Misteriosa (Nossa Senhora); dois Conselheiros (anjos); Tota, jovem travesti com belos traços femininos; Baby, travesti doente; Mira, travesti cinquentona; Lucas, garoto de programa; Ângelo, jovem de classe média frequentador do cinema; mãe da travesti Baby; filho da travesti Mira; sombras e um coro que recorre nas cenas.

Aproveitando o momento e o motivo da festividade do Círio de Nazaré, Carlos Correia Santos ousa chamar a atenção do público para uma reflexão a respeito do trabalho missionário realizado pela arquidiocese de Belém: 'Um cinema sujo, que exibe filmes de sexo explícito e que fica quase em frente à Basílica erguida em homenagem à devoção desta cidade... Isso não lhes parece estranho? Não lhes parece haver nisso algo a ser entendido?...' – afirma Nossa Senhora de Nazaré, representada pela Misteriosa, em diálogo com os Conselheiros, anjos que a acompanham, tentando convencê-la a não entrar no Cine Ópera.

Paralelamente a essas cenas que evocam o maravilhoso no drama, há elementos ordinários do enredo. Baby, uma travesti balzaquiana, agoniza contaminada pelo HIV, e seu último desejo é ver a pequena imagem peregrina de Nossa Senhora de Nazaré. Tota, outra travesti amiga de Baby, rouba a imagem e a leva ao cinema. A Misteriosa é a personificação do que representa essa imagem. A fala dos anjos conselheiros parece reproduzir o discurso anacrônico da beatice católica, que se nega a buscar o porquê das causas da profanação do corpo. Ao passo que o discurso da Misteriosa reproduz justamente a busca deste porquê.

Na parte ordinária da narrativa, produzida em linguagem informal e com predomínio da referencialidade, por oposição à linguagem emotiva e poética das cenas extraordinárias, observam-se as peculiaridades deste universo marginal cujo símbolo é o Cine Ópera: os preconceitos e a suposta masculinidade de Lucas, que fora abusado sexualmente na infância pelo padrasto e que – como todos os garotos de programa – vê na prostituição um pretexto para exercer sua sexualidade do modo como ela se lhe apresenta; a falta de cuidado, em todos os sentidos, ao fazerem sexo; a necessidade que os frequentadores do Ópera têm de se manterem em sigilo e os motivos que os levam a saciar seus desejos na prostituição; as tentativas de fuga da homossexualidade e as consequências desastrosas dessas fugas... Tudo isso é abordado com muita poesia em Ópera Profano.

'Por que algo que é santo não pode entrar aqui? Por quê?... Há santidade em nós também... Em algum canto esquecido de nós... há santidade' O texto também trata do desprezo vivido por muitos homossexuais rejeitados por suas famílias em razão de sua orientação sexual. A maternidade universal de Maria é a misericórdia que não se encontra em mães humanas, cujas expectativas a respeito da sexualidade de seus filhos foram frustradas, por não seguirem padrões socialmente ordinários de conduta sexual. Infelizmente, o apego a esses padrões suplanta o amor que deveria reger a relação entre pais e filhos.

Machado de Assis trabalhou a eterna contradição humana, a ambigüidade, a dualidade do homem no conto fantástico A Igreja do Diabo, utilizando-se dos elementos espaço-temporais próprios da sociedade brasileira do século XIX, para se opor à visão romântica em torno do homem, formada pelos valores religiosos contra-reformistas, desde a formação da colônia.

Em pleno século XXI, num hibridismo metalinguístico, Carlos Correia Santos desafia a rigidez acadêmica das teorias da literatura, para ousar sobre os elementos de nosso tempo e lugar, não esquecendo que o Círio de Nazaré também se renovou como mito durante toda a época machadiana, de modo que, embora em menor escala, não deixamos de justificar nossos preconceitos nessa mística do sagrado. Apesar de que 'Quem só conhece o azul do Céu quer porque quer conhecer o escuro do Inferno...'. A denúncia à hipocrisia de ignorar a realidade acontece através de frases impactantes: Na vida, o que está à margem vira escuridão./ O que não convêm aos olhos vira inexistência...

Os elementos regionais que geralmente são evocados como atração turística nesta época de outubro também aparecem na memória das personagens, ao lado das reminiscências que dão à Misteriosa a explicação que ela busca ao entrar no Cine Ópera. A maternidade é colocada em discussão e até a devoção e o culto às imagens, tão criticados pelos cristãos protestantes.

O clímax da peça fica por conta das revelações a respeito da trajetória de cada personagem. Revelações estas que lhes rendem uma aparição de Nossa Senhora. Num nível linguístico, o texto congrega poesia de primeira grandeza, entremeada com paráfrases de textos bíblicos e a reprodução das sete palavras proferidas por Jesus em sua agonia de morte, pela boca da travesti Baby

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

O PALCO CHAMA A ÓPERA

Com enredo polêmico, texto de Carlos Correia ganha montagem de Guál Dídimo e Haroldo França. Um total de 17 canções foram compostas para o projeto.


Imagine se a imagem de Nossa Senhora de Nazaré, a mesma usada em todas as romarias do tradicional Círio, fosse furtada por um travesti e acabasse indo parar dentro de um cinema dedicado à exibição de filmes adultos. Um cinema freqüentado por transexuais, garotos de programa e jovens da classe média. Pois esse é o inquietante mote do espetáculo “Ópera Profano”, que estreia no próximo dia 14, às 21h, no Teatro Universitário Cláudio Barradas. Com dramaturgia assinada por Carlos Correia Santos e direção de Guál Dídimo e Haroldo França, a montagem fica em cartaz até o dia 17. O texto de Correia ganhou, em 2005, o Prêmio Literário Cidade de Manaus, foi publicado em livro e agora chega aos palcos. Concebida sob o formato de musical, a peça reúne atores, cantores, bailarinos, coreógrafos, músicos e cenotécnicos de forma ainda pouco comum na cena teatral local. Um total de 17 canções, completamente autorais, foram compostas especialmente para o projeto.

“Trata-se uma montagem corajosa, que tem sido concebida há cerca de dois anos. O que se verá em cena é um resultado intenso e bastante poético.”, adianta Carlos. Guál Dídimo ressalta que o trabalho aposta de forma ousada em um gênero desafiador, ainda pouco usual na região Norte. “Temos orgulho de dizer que esse é um espetáculo de teatro musical. Eu e Haroldo mergulhamos num processo de encenação que valoriza essa característica da obra original. Não é uma peça com canções pontuando diálogos, e sim um trabalho em que a música é também uma das protagonistas”.

Haroldo França conta que o processo de construção do espetáculo exigiu vários esforços: “Criamos as melodias para as letras do texto original, propusemos alguns outros momentos musicais e ainda fizemos a seleção e a preparação do elenco, que precisava ter habilidades particulares. A concepção que idealizamos exigia atores-cantores”.

ELENCO

O time de artistas que dá vida aos provocativos personagens é, de fato, especial. A produção marca a estreia como atriz da cantora Cacau Novais. O cantor Léo Meneses interpreta o travesti Baby. Dário Jaime e Fábio Tavares vivem, respectivamente, os travestis Tota e Mira. O elenco conta também com Tiago de Pinho, Marlene Silva, Leonardo Bahia e Rafael Feitosa. A encenação tem ainda as participações dos bailarinos Angélica Monteiro, Franco Salluzio, Isabel Lobato e Nigel Anderson. As apresentações terão execuções musicais ao vivo conduzidas por Welliton Barreto (percussão), Guál Dídimo (teclado), Armando Mendonça (viola) e Ramón Rivera (violão). A concepção de luz é de Sônia Lopes. O visagismo é de Nelson Borges e as fotos de divulgação são de João Ramid.

O tema polêmico proposto pela obra de Carlos Correia trouxe uma dificuldade que, no final das contas, não impediu o êxito da produção: “O espetáculo não conta com nenhum patrocinador. Temos grandes apoiadores, como Tina Sâmia (Pink Android), o fotógrafo João Ramid, a Raf Mix, que cedeu material de maquiagem, e o visagista Nelson Borges. Mas não conseguimos que nenhuma marca quisesse se associar a uma peça em que travestis se mostram tão devotos quanto quaisquer outros cidadãos e reivindicam o direito de se aproximar da imagem de Nossa Senhora”, afirma Correia. Guál, no entanto, mantém-se otimista: “Tomara que isso mude. Ainda esperamos sensibilizar alguma empresa. Esperamos contar com patrocínios para outras temporadas da peça. Nossa meta é que o espetáculo tenha vida longa porque as questões colocadas em cena precisam ser vistas, ouvidas e debatidas”.

ENREDO

Na trama criada por Carlos Correia Santos, o travesti Tota provoca um tumulto na capela de onde sai a procissão da trasladação. Em meio à confusão, ele furta a imagem da Santa e a leva para um tradicional cinema de filmes pornográficos que, ironicamente, fica bem em frente à Basílica Santuário. O ato tresloucado tem uma razão afetiva: Tota quer realizar o sonho de sua colega travesti Baby. Dentro do cinema, lutando contra as complicações decorrentes do HIV, Baby sonha em se aproximar de Nossa Senhora e rezar por um bom descanso. Em meio a este caos emocional também se encontram um ríspido garoto de programa chamado Lucas, o jovem Ângelo, que freqüenta o local sem que sua conservadora família suspeite, e o decadente travesti Mira que, na juventude teve um filho, do qual não possui mais qualquer notícia. Pontuando o drama, três misteriosas figuras, uma mulher e dois conselheiros, transitam por entre os personagens sem serem vistos e tentam entender por qual razão todas aquelas vidas são completamente ignoradas pela sociedade.

Serviço: Ópera Profano – O Musical. Dias 14, 15, 16 e 17 de outubro, às 21h, no Teatro Cláudio Barradas (Jerônimo Pimentel com Dom Romualdo Seixas). Ingressos: R$ 20,00 com meia para estudantes. Apoio: Pink Android, João Ramid e Raf Mix. Mais informações em www.operaprofano.com.br

FICHA TÉCNICA

Da Obra de Carlos Correia Santos
(Vencedora do Prêmio Literário Cidade de Manaus)
ÓPERA PROFANO

Adaptação Dramatúrgica e Música:
Guál Dídimo e Haroldo França

Arranjos:
Armando Mendonça e Ramón Rivera

Letras:
Carlos Correia Santos, Guál Dídimo e Haroldo França

Elenco:
Tiago de Pinho (Ângelo)
Léo Meneses (Baby)
Fábio Tavares (Mira)
Marlene Silva (Conselheira)
Leonardo Bahia (Conselheiro)
Rafael Feitosa (Lucas)
Dário Jaime (Tota)
A Misteriosa (Cacau Novais)

Bailarinos convidados:
Angélica Monteiro
Franco Salluzio
Isabel Lobato
Nigel Anderson

Coreografias:
Franco Salluzio
Guál Dídimo
Nigel Anderson

Músicos:
Welliton Barreto (percussão)
Guál Dídimo (teclado)
Armando Mendonça (viola)
Ramón Rivera (violão)


Arranjos adicionais:
Gabriel Paganine
Thales Branche

Concepção de luz:
Sônia Lopes

Operação de luz:
Frank Costa

Visagismo:
Nelson Borges

Vídeo e Som:
Haroldo França

Fotos:
João Ramid

Designer gráfica:
Tina Sâmia (Pink Android)

Assessoria de comunicação:
Carlos Correia Santos

Direção Adjunta: Haroldo França
Direção geral: Guál Dídimo