quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

MATÉRIA DO JORNAL ESTADO DE SÃO PAULO


Reproduzo aqui interessante destaque nacional dado ao meu trabalho. O texto abaixo, assinado pela conceituada jornalista Beth Néspoli, foi capa do Caderno 2 do jornal Estado de São Paulo, matéria publicada em 13 de fevereiro de 2007

TEATRO DE VENCEDORES

Concursos mudam a vida dos dramaturgos premiados? Em busca de respostas, a reportagem do Estado entrevistou 14 autores de 8 Estados e 5 regiões do Brasil

Beth Néspoli

Quem são os premiados nos concursos de dramaturgia? Tal premiação influi na carreira do texto e/ou de seu autor? Em busca de respostas, a reportagem do Estado decidiu conversar com alguns desses escolhidos. Os entrevistados estão entre os vencedores dos prêmios Funarte (MinC) e Carlos Carvalho, este último promovido pela prefeitura de Porto Alegre (RS), selecionados por conta de sua abrangência nacional. Foram 14 autores premiados entre 1988 e 2005, de oito Estados das cinco regiões do País.

Vencer concurso leva uma peça ao palco? As respostas são tão diversas quanto os textos premiados. “Para mim, abriu caminho”, diz Carlos Correia Santos, de Belém (no destaque). “Em 2003, ter sido aprovado por um júri especializado serviu como selo de qualidade. Afinal, não existe crítica para um dramaturgo iniciante, não encenado”, argumenta. No seu caso, logo após o concurso, foi procurado por um grupo interessado em encenar Biblioteca Mabu. A partir daí, vieram outros prêmios, outras montagens, e ele não mais parou.

Mas até agora a história é outra para Edivaldo da Silva, de Brasília, 1º lugar na categoria adulto, região Centro-Oeste, no Concurso da Funarte de 2005, com Laura. “Para quem está iniciando ajuda, porque dá visibilidade e credibilidade, mas o principal é a montagem, senão é prêmio de literatura”, diz. “E aí não depende só de interesse, mas das dificuldades de produção impostas pelo texto. No meu caso, há quem queira encenar, mas não se conseguiu levantar a produção”, diz Edivaldo.

Com quatro peças encenadas, Sérgio Roveri, 1º lugar na Funarte em 2005 por Com Vista para dentro, pensa de forma semelhante. “Ter sido selecionado é um grande estímulo, mas a montagem (estréia dia 28 em São Paulo) depende de outros fatores que vão do elenco ao interesse de um diretor.”

A publicação do texto por si só - e isso os concursos fazem -, num país de dimensões continentais, não amplia o leque dos interessados? Mais uma vez, as respostas variam entre sim e não.“Há uma diferença entre impressão e publicação”, observa Marcos Barbosa, autor experiente e de sólida formação cultural (no destaque). “Os concursos imprimem as peças, mas a circulação e a divulgação são muito restritas”, diz ele, que tem vários textos encenados no Brasil e no exterior.

Mas há quem pense diferentemente dele, até dentro de casa. Sua mulher, Cláudia Barral, fala com entusiasmo das conseqüências de ter ficado em 3º lugar na Funarte, em 2003, com a peça Cordel do Amor sem fim. “Recebi propostas de trabalho e o texto teve leitura dramática na Bahia e no CCBB de São Paulo, sob direção de Francisco Medeiros.

Naldo Alves, gaúcho radicado no Rio, é médico, ator, diretor, e atualmente dedica-se a criar programas educativos institucionais. Foi o 1º colocado em 1988 no Concurso Carlos Carvalho com Tortura não É Brinquedo, peça encenada em Porto Alegre e no Paraguai, esta última porque o livro bateu nas mãos da diretora Erenia López em uma viagem por Porto Alegre. “Foi por acaso mesmo”, diz Naldo.

Ainda assim, há o outro lado dessa moeda. “A publicação é ótima, claro, mas já flagrei duas montagens no interior sem autorização e quase suspendi uma de Vestir o Pai feita numa escola de São Paulo”, diz o paulista Mário Viana (no destaque). “Não é pelo dinheiro, mas por respeito e ética”, diz.

Se há um ponto onde todos convergem é a lisura no processo de escolha. Nos dois concursos em foco, salta aos olhos a mistura extrema entre autores experientes e iniciantes. O paulista Dagomir Marquaze, de 53 anos, por exemplo, conseguiu a proeza de tirar o 1.º lugar no concurso da Funarte na categoria adulto em 2004, na concorrida região Sudeste, com a peça Intervalo. “Não tenho nenhum conhecimento nessa área de teatro, o que prova não ser um concurso viciado”, diz. “Eu estava cansado de fazer roteiros e projetos para cinema que não davam em nada e resolvi escrever uma peça sem muita esperança. Ganhei!” A trama transcorre durante as gravações de uma novela. “É entretenimento, sem outra ambição. Tem produtor interessado no Rio, mas ainda não há nada de concreto.”

O gaúcho Gabriel Camargo, 1º lugar na região Sul no concurso da Funarte de 2005, com a peça A Ufania do Pecado, é psiquiatra e aproveitou o prêmio para editar seu primeiro romance.

Paulista de Penápolis radicado em Florianópolis, Carlos Eduardo Silva, de 46 anos, tem um respeitável currículo como maquiador de teatro. E ainda três textos teatrais premiados, entre eles A Filha da..., selecionado pelo MinC em 2000 e dois anos depois encenado no Rio com Marília Pêra no elenco. Quem freqüenta o Centro Cultural São Paulo conhece o atento funcionário Paulo Jordão. Pois ele tem mais de um texto premiado, nenhum ainda encenado profissionalmente, entre eles Corrida ao Caos, 3º lugar no Carlos Carvalho em 2002. “Acho o concurso importante, porque alguém pode ler e se interessar, como Elis Regina fazia com novos compositores”, sugere Jordão.

Evidentemente, a dramaturgia não é feita só de gênios - eles são raros, um a cada século, e em geral são assim avaliados depois de sua morte. Nenhum país do mundo possui uma cena vital sem bons dramaturgos que a alimentem no dia-a-dia. No Brasil, eles existem e não apenas nos grandes centros, foi a feliz constatação desta reportagem. E suas obras circulam. O diretor carioca Amir Haddad já montou peças do cearense Mapurunga. Textos de Mário Viana foram montados em Fortaleza e no Recife.

Todos os autores em destaque nesta página têm peças de indubitável qualidade, como De Braços Cruzados, do cearense Emmanuel Nogueira, cuja poética remete a autores nordestinos de reconhecido talento, como Gero Camilo e Newton Moreno. Em conjunto, esses dramaturgos refletem a riqueza cultural deste País, com obras que mereciam intercâmbio mais intenso, e constante.De palco em palco, e não só no Brasil.

DESTAQUES

Carlos Correia Santos, 31 anos, Belém – PA: Cinco prêmios de dramaturgia, entre eles duas vezes 3º lugar nos concursos da Funarte de 2003 e 2005, na categoria infanto-juvenil, com Biblioteca Mabu e Ludique. E 1º lugar na categoria adulto, em 2004, com a peça Júlio Irá Voar. Nove textos escritos, cinco encenados em Belém e em outros Estados, entre eles, Amazonas e São Paulo. Nu Nery, drama baseado na vida pintor e poeta Ismael Nery, ganhou também o Prêmio Funarte Petrobrás de Fomento ao Teatro em 2005 e o Caravana Funarte Petrobrás de Circulação Nacional. A montagem do grupo Palha, de Belém, foi selecionada para participar do Festival Brasileiro de Teatro de Itajaí (SC), em 2007. Jornalista, produtor cultural, bacharel em Direito, poeta, contista, cronista e dramaturgo. (OBS: Informações da época em que a matéria foi publicada. Hoje, conto com mais prêmios em dramaturgia, mais espetáculos escritos e mais encenações)

Marcos Barbosa, 29 anos, Salvador, BA: Cinco textos premiados entre os quais se destacam Braseiro, Prêmio Lourdes Carvalho, em Campina Grande (PB), em 2000, e Avental Todo Sujo de Ovo, 1.º lugar no Concurso Carlos Carvalho, de Porto Alegre (RS), em 2005. Onze textos encenados em diversos Estados e no exterior. Braseiro já teve três encenações: Fortaleza, em 2000; São Paulo, em 2003, na Mostra de Dramaturgia do Sesi; Salvador, em 2005, e ainda leitura dramatizada no Royal Court. Quase Nada foi encenada sete vezes, no Brasil e no exterior. Montagem dirigida por Alain Brum reestréia em São Paulo, no dia 23, no Teatro Cacilda Becker. Doutorando e mestre em Artes Cênicas pela Universidade Federal da Bahia, onde também é professor de dramaturgia e teoria teatral.

José Maria Mapurunga, 55 anos, Fortaleza – CE: Com dramaturgia que reflete sua pesquisa em cultura popular e literatura de cordel, ganhou em 1998 o Prêmio Carlos de Carvalho, com A Farsa do Panelada e, em 1999, o Prêmio Carlos Câmara, em Fortaleza, com o Auto de Leidiana.Tem 19 peças encenadas, em diversos Estados e no exterior, e três textos inéditos. A Farsa do Panelada foi encenada em Maputo (Moçambique) e nos Estados do Rio, Ceará, Pernambuco e Pará. Uma montagem de Porto Alegre foi apresentada na Argentina e no Uruguai. Só o grupo Mapati, de Brasília, tem no repertório seis peças de sua autoria já apresentadas em Estados como Paraná, São Paulo, Mato Grosso, Rio, Minas, Goiás, Rondônia e Acre. Dramaturgo, poeta, escritor, roteirista, cordelista e criador de histórias em quadrinhos.Orlângelo Leal, 32 anos, Itapipoca – CE: Dois textos premiados no Concurso de Dramaturgia da Funarte: As Prosopopéias de Casimiro Côco (2004) e Noite Serena de Lua Cheia(2005).Oito peças encenadas - inclusive as premiadas - no Ceará e também em estados, como Acre, Goiânia e Rio. Musicou os espetáculos teatrais Bagaceira, Enquanto o Mundo Pega Fogo, Vaca Lelé e O Casamento de Tabarim. Para cinema, musicou o curta-metragem A Morte Prepara o Laço. Multiartista, pesquisador da cultura popular brasileira, é brincante, autor, diretor, ator e compositor. Integrante da Trupe Metamorfose e músico da banda Dona Zefinha, com a qual viajou para a Alemanha e lançou os discos Cantos e Causos e Zefinha Vai à Feira.

Mário Viana, 46 anos, São Paulo – SP: Seis premiações em dramaturgia, entre elas no Concurso Carlos Carvalho, nos anos de 2000 e 2001 por, respectivamente, Vamos?e Vestir o Pai. Em 2003, Galeria Metrópole ficou em 2º lugar, região Sudeste, no concurso da Funarte.Tem 20 peças escritas e 10 encenadas, entre elas Vestir o Pai, sob direção de Paulo Autran, e Galeria Metrópole. A primeira, com o título Vestiendo a Papá, foi encenada pelo grupo La Gaviota, no Uruguai, e valeu a Olga Olhagaray o prêmio de melhor atriz de 2006. Carro de Paulista, escrita com Alessandro Marson, está há quatro anos em cartaz.Dramaturgo, jornalista e co-autor de novelas.

Emmanuel Nogueira34 anos, Fortaleza – CE: Oito textos premiados, entre eles, 1º lugar em 2002 no Concurso Carlos Carvalho, com Os Cactos, e 1º lugar da região Nordeste no concurso da Funarte, em 2005, com De Braços Cruzados. Recebeu ainda auxílio de montagem do MinC, prêmio Encena Brasil, para A Serva.Onze peças escritas, 5 encenadas - Os Cactos e De Braços Cruzados estão em fase de ensaios em Fortaleza. Sua comédia Esperando Comadre Daiana, encenada por um grupo de Juazeiro do Norte, está há um ano e meio em cartaz, e foi vista por 6 mil espectadores em 17 cidades dos Estados de Piauí e do Ceará. Roteirista, dramaturgo e jornalista com especialização em Teoria da Comunicação e da Imagem pela Universidade Federal do Ceará.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

ENTREVISTA PARA O HOLOFOTE VIRTUAL


Reproduzo aqui entrevista feita comigo para o site HOLOFOTE VIRTUAL, da jornalista Luciana Medeiros. Confiram.


Entrevista: Carlos Correia Santos comemora 2009 e conta as novidades deste ano novo

Para Carlos Correia Santos, a virada para 2010 foi de agradecimentos, pois o ano que passou, para ele, foi de muitas conquistas. “Vou usar todas as letras que puderem me cercar para agradecer. E, claro, vou dançar, rir, celebrar”, disse no finalzinho de 2009 ao Holofote Virtual.

No ano passado, Carlos C. Santos teve seu primeiro romance editado, depois de vencer o Prêmio Dalcídio Jurandir. O espetáculo Júlio Cezar, montado a partir de outra obra sua, chegou à capital federal. Um outro foi vencedor do prêmio IAP de literatura – dramartugia -, e teve o prefacio escrito por um mestre, Cláudio Barradas.

Ao longo do ano foram inúmeras as parcerias feitas. Em Quatro Versus Cadáver, com Saulo Sisnando, por exemplo, e fechando 2009, com “Solo de Marajó”, com Alberto Silva Neto e Cláudio Barros.

Para 2010 já há novidades. A obra de Carlos C. Santos está sendo estudada e debatida por mestres da UFMG. E ele já escreve uma nova peça sobre Ismael Nery além de acompanha outras duas em processo de montagem, a partir de textos que venceram o edital Claudio Barradas, da Secult. Sem esquecer que “Perfídia Quase Perfeita”, premiado em 2007, seu primeiro texto cômico, estréia em março, em Curitiba.

Fora isso outra grande notícia é que o livro “Não Conte com o Número Um no Reino de Numesmópolis”, vencedor do III Concurso Literatura Para Todos terá uma tiragem de 300 mil exemplares e será distribuído para neoleitores de todo o Brasil e da África.

Trabalhando atualmente como Secretário do Sistema Estadual de Bibliotecas do Pará, Carlos assina uma coluna na Rádio Liberal CBN e é comentarista de arte no Jornal do Meio Dia, da TV Cultura.

Carlos segue uma rotina de trabalho, mas também cuida da saúde e trata de se divertir. “Nos finais de semana vou ao cinema, teatro, danço”. Faz tudo isso sem deixar de acompanhar os processos de montagem de espetáculos que surgem a partir de seus textos e à noite dedica-se a escrever.

Nesta entrevista, entre outras coisas, Carlos fala de suas premiações, de seu caso ainda em suspense com o cinema, da cena da literatura no Brasil, no Pará e no mundo, além de anunciar suas novas perspectivas para 2010.

Holofote Virtual: O ano de 2009 foi bom para o profissional Carlos Correia Santos?

Carlos C. Santos: O ano de 2009 foi crucial. Como um refrão perfeito para uma letra de canção arduamente construída. Foi um ano que me escreveu emoções singulares. Meu primeiro romance editado. E editado de uma maneira especialíssima.

O livro foi o primeiro a vencer o Prêmio Dalcídio Jurandir, na categoria romance, justo no ano em que se celebrava o centenário de Dalcídio. Um ano em que vi minha peça sobre Júlio Cezar chegar a Brasília. A capital federal. Além disso, vejam que poética metáfora.

A peça fala sobre um gênio da aviação e foi ser apresentada numa cidade que tem forma de avião. Observações de poeta louco talvez (risos). Um ano de rompimentos com antigos parceiros (coisa que faz parte do enredo de qualquer vida). Mas também um ano em que firmei novos e formidáveis enlaces.

Teve o prefácio do mestre Cláudio Barradas para o meu livro Batista, que ganhou o premio IAP na categoria dramaturgia. Teve a parceria com Saulo Sisnando, no delicioso Quatro Versus Cadáver (que ganhou prêmio da Funarte e vai para outros Estados) e teve a realização de um sonho: trabalhar com o colossal Cláudio Barros.

Foi lindo o processo de construção de Solo de Marajó, brilhantemente dirigido por Alberto Silva Neto. A peça também tem promessas de caminhos belos pela frente.

Holofote Virtual: Na vida pessoal houve um investimento visual, estético. Qual foi este processo?

Carlos C. Santos: (Risos) Tenho um querido amigo, o talentoso designer Wendell Pimenta, que resume isso assim: Carlos Correia decidiu unir Esparta a Atenas (Risos). E talvez seja por aí. Cheguei a pesar 110kg.

Percebi que até queria e quero que minha escrita seja reconhecida por ter peso. Mas este peso não precisa ser de lipídios meus. Emagreci 46kg sem cirurgias. Até aproveito o espaço para deixar claro: não, eu não fiz redução de estomago. Fiz dieta rigorosa e virei adepto de Santa Carmem Academia. Hoje também me benzo diante de halteres (risos).

Bem, falando sério: por que poetas não podem ser sarados? Pergunto isso porque vejo as pessoas se escandalizarem quando me descobrem um malhador. É comum ouvir falarem: mas não combina. Um cara que trabalha a intelectualidade não precisa trabalhar a massa muscular. Ora, meu povo, o corpo é também um poema. Precisa de versos para a boa saúde. É só essa a escrita que agora também desenho: saúde.

Holofote Virtual: Escritor, jornalista, dramaturgo, roteirista, advogado, poeta... Como assim (risos)?

Carlos C. Santos: Eu sou um curioso, um insatisfeito, um inquieto. Eu quero do mundo tudo o que o mundo queira me dar. E quando o mundo se recusa a me dar algo, aí é que eu pelejo para abraçar o que parece impossível. Na verdade, amo exercitar tudo o que parta da escrita. O jornalismo me atrai porque é uma feição do lidar com o textual. Dentro da arte literária, todos os gêneros me interessam.

Assim como a um pintor todas as cores e ângulos interessam. Assim como para um ator todas as cenas e palcos são relevantes. O que sempre esteve e sempre vai estar latente em mim é urgência de ditar palavras, frases, escritas.

Que virem texto jornalístico, que virem dramaturgia, poema, conto... Que virem cena... Que virem respostas para uma ótima entrevista... Que virem um bilhete grudado na geladeira confessando amor a alguém sem raro...

Holofote Virtual: Como é esta relação, onde todas estas vertentes artísticas se cruzam?

Carlos C. Santos: Como disse acima, minha relação com todas estas vertentes é a de investigação, de esguelha, de curiosidade.

Sabe criança que fica cutucando algo que ela espera conhecer melhor e dali saem deliciosas trelas? É isso. Só que arte é trela muito, muito séria.

Na foto "Ismael em três traços", que vai estrear em manaus

Porque a razão maior de eu tentar ser esse bolinador das formas muitas de escrever é o compromisso que tenho com o afeto. Gosto sempre de falar isso.

Minha meta maior sempre é afetar. Quero afetar o outro com o que escrevo. Tenho essa utopia. Quero causar prazer, agonia, dengo, dor, riso, fúria. Tenho horror a não reação. Tudo estará errado para mim quando eu escrever coisas que nada provoquem. Nem que seja ódio imenso.

Prefiro que me digam: odiei aquele teu texto, que nada sintam ou percebam. É como sentencia Karine Jansen, a meta do artista é comover. Mover-se com. Um escritor quer se mover com quem o leia. Para o bem ou para o mal.

Holofote Virtual: Podes não fazer música, mas falas de música em teus trabalhos, assim como de artes plásticas (Nu Nery...Theodoro...). És plural, mas seria esta uma maneira de também alcançar as artes que não dominas profissionalmente?

Carlos C. Santos: Mas eu faço música também (risos). Estudei violino por muitos anos. Violino e violão. E sou parceiro de Nilson Chaves, Lucinha Bastos, Firmo Cardoso e Renato Gusmão. Canções minhas com Nilson já foram gravadas por artistas de vários lugares, como Macapá. Recentemente, o Arthur Espíndola incluiu em seu repertório uma dessas canções, chamada “Teu Nome Sou Eu”.

Devo mesmo ser um doido que tenta ter mil braços!!! (Risos) E tem algo curioso que precisa ser dito: Julio Irá Voar é originalmente um musical. Assim o texto ganhou o Prêmio Funarte de Dramaturgia em 2004. Como texto de musical. Não foi montado como tal, mas é.

Agora considerando a pergunta... Preciso concordar... Quando escrevo dramaturgias sobre artistas plásticos... no fundo... é, de fato, uma tentativa de buscar saber como é criar a partir das cores...

Holofote Virtual: Tens inúmeros prêmios. Já deu pra contabilizar, como lidar com isso? Quais entre tantas tu eleges como mais relevantes e estimulantes ao teu trabalho? Ou qual aquela que realmente pôde ter mudado a tua vida?

Carlos C. Santos: Eu festejo muito essas premiações e faço total questão de divulgá-las o mais amplamente possível porque, sinceramente, sinto que são modos de premiar também a minha terra, o meu berço. Quase sempre nessas vitórias nacionais sou o único autor nortista destacado. Não é, portanto, um prêmio só do Carlos. É um prêmio para o Norte. Esse Norte ainda tão desrespeitado lá fora, tão ignorado, tão desconhecido. Queria, com plena e pura sinceridade, que as pessoas vissem assim.

Não é um fulano se gabando porque ganhou isso ou aquilo. É um paraense mostrando aos seus que o Brasil reconhece que aqui tem arte de valor. Coisa um pouquinho mais importante – creio eu – que ser escolhido para um reallity show ou ser um jogador perna de pau que merece as honras de um programa televisivo dominical.

Com todo respeito aos produtos da sociedade do orgasmo em que vivemos... Além disso, considero as premiações vindas de bancas compostas por notórios pensadores o preenchimento de uma lacuna. O da crítica.

Quando um texto meu passa por um crivo nacional, concorrendo com centenas de obras das mais diversas origens, esse texto esta recebendo uma crítica favorável. Não há mais crítica artística nesse país, muito menos aqui em nossa região. Outro ponto é a publicação e a distribuição das obras.

Não temos comumente, a nossa disposição, editoras que apostem em novos talentos. Temos menos ainda uma estrutura de distribuição de nossas obras. É digno, portanto, de fogos muitos ser escolhido entre dezenas para ser editado e ter seus escritos levados ás mais diversas praças.

Confesso que nunca contei os prêmios que já ganhei. Mas três eu destaco de bate pronto. O primeiro lugar no premio Funarte de Dramaturgia em 2004, para Julio Irá Voar. Sobretudo pela chance de divulgar em nível nacional o legado de Julio Cezar Ribeiro de Souza.

Destaco também o Seleção Brasil em Cena, do CCBB Rio, em 2007. Quase mil autores de todo o país participaram. Somente doze foram selecionados. Oito do Rio, três de São Paulo e eu era o único “estrangeiro”. Um dos também selecionados foi o Fábio Porchat, que eclodiu graças a esse premio. Fui selecionado com meu primeiro texto teatral cômico, “Perfídia Quase Perfeita”. A obra ganhou leitura dramática dirigida por Stella Miranda.

Perfídia agora está sendo montada por Claudio Marinho e estréia, em março, em Curitiba. Por fim, destaco o recentíssimo prêmio no III Concurso Literatura Para Todos, promovido pelo MEC. O mais importante prêmio da minha carreira até aqui. Venci na categoria dramaturgia com a peça infantil “Não Conte com o Número Um no Reino de Numesmópolis”.

Fizeram parte da banca julgadora Affonso Romano de Sant´Anna, Moacyr Scliar e Alice Ruiz. O livro terá 300 mil exemplares de tiragem (isso é tiragem de best-seller) e será distribuído para neoleitores de todo o Brasil e da África.

Holofote Virtual: Dá para perceber que isso às vezes causa algumas reações menos nobres nos “outros”? Como reages a esse tipo de coisa?

Carlos C. Santos: (Risos) Impossível não citar Nelson Rodrigues. Ele já dizia: para o brasileiro, o sucesso de alguém ao seu lado é uma ofensa pessoal. E olha que eu estou longe de me achar um cara que faça sucesso. Eu luto e tenho conquistas. Que, como já disse, são minhas e de todos os meus...

O olhar de mal querer que se lança sobre nós faz parte do pacote. Vivemos num tempo em que o êxito é algo cada vez mais difícil. São muitos a querer, são muitos os qualificados, são pouquíssimas as portas pelas quais passar. É até de se entender a dor que talvez cause ver o outro ter o que queríamos ter e não temos.

Eu lastimo. Lastimo que tenha quem se dedique a desconsiderar o êxito do outro. Mas é como diz Cazuza: vamos pedir piedade... Senhor, piedade... Piedade para as almas enfadadas por trabalhos infelizes, por rotinas afetivas lamentáveis... que, sem portas de luz pelas quais passar, conectam-se ao provedor da miséria e mandam por ai emails para cretinice... A sorte é que, em tempos de banda larga, eu sei que é tão tolinho ter mente estreita... Enfim... Senhor, piedade...

Holofote Virtual: Você fez várias parcerias este ano. Com é tua relação com o outro?

Carlos C. Santos: O outro para mim é sempre, sempre alvo da minha paixão e cobiça. Amo. Ave, Mario de Sá Carneiro. Sim... “Eu não sou eu nem sou o outro... Sou qualquer coisa de intermédio...” Sempre tive consciência de que sou um escritor hoje porque ontem houve outros mestres. Que sou um artista do agora porque agora tenho mestres aos quais quero dar as mãos. Que só serei um escritor que ficará no depois se outros e mais outros e mais outros leitores me derem os braços. Um parceiro sou eu redefinido.

Holofote Virtual: Fazendo uma retrospectiva, vamos lembrar aqui dos momentos de bastidores?

Carlos C. Santos: Os bastidores do teatro são preciosos. Eu adoro acompanhar as montagens porque sempre nos trazem coisas belas. Lembro de Luis Carlos Bassalo Crispino (grande pesquisador de Julio Cezar Ribeiro de Souza) assistindo os ensaios de Julio Irá Voar. Sua emoção emocionou-me. Lembro de Stella Miranda no CCBB, no Rio, vindo me parabenizar pelo texto de Perfídia.

Para além do teatro, lembro-me de quando fui conhecer José Louzeiro. Eu tremia de nervosismo. Entreguei a ele um exemplar de Nu Nery e ele me disse: fui amigo de Adalgisa Nery. Outro momento marcante de bastidores aconteceu na recente premiação do Concurso do MEC, que aconteceu na Confintea, evento da Unesco.

Eu estava sentado ao lado da viúva de Paulo Freire (foto acima). Fui escolhido para subir ao púlpito e discursar. Quando voltei, ela me disse: “rapaz, parabéns. Eu quis falar e não me deixaram. Por causa do protocolo. Tiveste uma linda chance. Parabéns”. Tenho vivido coisas lindas. Tudo por conta do escrever. Isso é belo.

Holofote Virtual: A parceria com o ator e jornalista, atualmente também professor da Escola de Teatro e Dança da UFPA, Alberto Silva Neto, este ano, trouxe ainda Cláudio Barros num solo marajoara de Dalcídio Jurandir. Conta como foi este entrelaçamento... O espetáculo volta em cartaz em 2010?

Carlos C. Santos: Sim, o espetáculo deve voltar. A experiência de trabalhar com Alberto e Cláudio é, sem sombra de dúvida, uma guinada no meu envolvimento com o teatro. Um novo capítulo. Foi simplesmente uma experiência mágica. Doce. Tranqüila. Seis meses em que só nos cercamos pelo afeto e respeito mútuo.

Não tivemos uma única rusga. Entramos no processo despidos de toda e qualquer hierarquia. E nosso material de trabalho... uau... uma obra sem par... Os escritos de um mestre...

Confesso que no inicio tive medo. Adaptar Dalcidio Jurandir para o palco é uma tarefa abusadíssima. Mas o resultado parece ter sido dos melhores. O público tem manifestado as melhores impressões sobre a peça.

Holofote Virtual: Cinema. Você tem um roteiro premiado sobre Waldemar Henrique. Já li e acho que tem um curta lindo ali pra ser parido. O Era Uma vez Carol, rodado em 2004/2005, nunca foi montado. O que houve? Tens noticias? Há novos roteiros em vista?

Carlos C. Santos: Cinema é ainda meu amor não consumado. Namoramos, noivamos, até copulamos, mas o gozo ainda não veio. E eu me sinto frustrado nesse sentido. Comecei a exercitar dramaturgia escrevendo roteiros de curta

Os textos teatrais não foram os primeiros exercícios. Mas o palco, ladino, impôs-se primeiro. Não tenho notícias sobre o Era Uma Vez Carol. Não sei que destino foi ou será dado ao material filmado. O roteiro sobre o Waldemar permanece na gaveta.

Tive um conto adaptado para curta por estudantes de cinema de São Paulo. Chama-se “Toda Saudade é Vil e Vã”. Mas quero estar num set, viver isso. Vou contar um segredinho. Tenho pensado muito, mas muito mesmo em fazer faculdade de cinema. Mas uma das minhas doidas inquietações (Risos). Recentemente, um jovem estudante de audiovisual me pediu um dos meus roteiros de curta para filmar... Vamos ver...

Holofote Virtual: De maneira geral, como foi o ano para a Literatura?

Carlos C. Santos: Para a literatura atrelada aos grandes conglomerados comerciais, a coisa em 2009 não foi ruim, não. Basta ver o burburinho que algumas premiações nacionais, como o Jabuti, causaram. Vencedor de vários desses mega prêmios, Cristóvão Tezza é o novo queridinho da cena literária brasileira.

Mundo afora, entrementes, o livro começa a viver uma possibilidade instigante de mudança de suporte. Fala-se muito que, após algumas tentativas de formatação do chamado e-book, finalmente os livros eletrônicos vão começar a se espraiar pelo mercado.

Há coisa de poucos dias, um famoso best-seller americano anunciou que não vai mais trabalhar com editoras tradicionais, e sim com empresas formatadoras de livros eletrônicos. Isso está causando um reboliço. Será o anúncio do fim das editoras convencionais? Quem sabe?...

Em nível local, lamentavelmente, ainda vivemos distantíssimos de todos os frissons. Temos aqui uma Feira do Livro que se importa mais em folhear mega números (de público, de celebridades externas) que na valorização e repercussão para os artistas que fazem letras aqui. Além disso, o autor paraense ainda peleja por editar seus livros em gráficas, bancando ele próprio a edição.

Um suplício, meu povo, um suplício. No entanto, nomes ótimos não param de surgir e figuras já tarimbadas não cessam de se firmar e produzir por essas bandas. Que o digam Daniel da Rocha Leite, Dand M, Renato Torres, Eleazar Venâncio Carrias, Josette Lassance...

Holofote Virtual: Na tua opinião qual o atual cenário da cultura na região norte?

Carlos C. Santos: O cenário cultural nortista atual mantém-se como tem sido há muito. Um cenário de pelejas. Assim é fazer arte pelejar. Mas temos muito a aprender com nossos vizinhos.

Precisamos descobrir caminhos que nos levem a ter a autonomia produtiva de uma Manaus, por exemplo. Uma coisa é certa: espaço há. Para quem não perde tempo com os enredos da vida alheia e se concentra em fazer boas cenas em torno de suas próprias idéias.

Holofote Virtual: Tens, claro, tuas fontes de inspiração, sacações e idéias. De onde elas vêm e como tudo isso que se transforma em livro, poema, textos para teatro e cinema?

Carlos C. Santos: Um escritor que queira ter bons materiais em seus íntimos baús de criação tem o dever de ser um observador. Gosto de observar o ser humano. Suas belezas, mazelas, esquisitices. Gosto de prestar atenção nas minhas mazelas, belezas, esquisitices.

Do lugar mais inesperado pode surgir motivação para escrever. Não acredito no conceito de inspiração. Acho que ele remete a imagem do ser especial tocado pela musa. Faz pensar que o artista é uma criatura em torno da qual se alastra um facho que não atinge os demais. Não penso assim. Penso em observação que gera motivação.

É preciso treinar essa percepção. Assim como o ator está sempre de prontidão, mesmo quando está nas coxias, o escritor precisa estar sempre com seu radar ligado. Fora isso, para os trabalhos de dramaturgia histórico-investigativa, exercito a pesquisa constante.

Leio tudo que tange ao acervo memorialístico da minha terra. Eu quero escrever sobre a minha aldeia. Mostrar ao mundo o que ela tem de universal. Então, eu fuço, vou atrás, pergunto, quero saber, amo descobrir.

Holofote Virtual: A trivialidade te cabe (risos)?

Carlos C. Santos: Eu sou totalmente trivial. Gente, não existe isso de intelectual que passa o dia lendo e ouvindo música erudita. Curto isso. Muito. Mas curto isso também. Não somente isso. Eu sou um cara do meu tempo.

O escritor tem que ser uma figura do seu tempo para falar sobre esse tempo ou mesmo ter noção situacional para bem se transportar para tempos outros. Como criatura do meu tempo eu tenho que me permitir pelo menos conhecer as tecnologias e apelos todos que minha época oferece.

Eu assisto Roda Viva e novela das oito. Eu vejo filmes de arte em canais a cabo, mas também me permito passar os olhos em reallity shows. Sou desse tempo.

Sou de um lugar em que se executa Beethoven para Nossa Senhora no Círio, mas que também vive o fenômeno popular do Tecnobrega. Se eu quiser escrever um romance que se passa no subúrbio de Belém, eu tenho que ser verossímil e saber como dar contornos aceitáveis a um personagem que goste de Tecnobrega.

Isso não significa que eu seja um consumidor desse ou daquele produto da industria cultural. Somos barqueiros navegando um mar de loucuras midiáticas. Temos que visualizá-las muito bem, para não encalharmos onde não queremos. Cabe a cada um de nós pescar em todo esse mar aquilo que nos faça bem a alma.

Holofote Virtual: Podemos falar de política cultural no Estado do Pará de que forma?

Carlos C. Santos: Existem tentativas que apontam para coisas que podem ser boas. Existem lacunas sobre as quais tentativas algumas existem. Vou citar Caetano... Eu quero crer que o melhor “virá... impávido que nem Mohamed Ali... Virá que eu vi...”

Holofote Virtual: Ainda estás trabalhando na imprensa?

Carlos C. Santos: Minhas relações com os veículos midiáticos, no momento, são duas: sou comentarista da rádio O Liberal CBN (tenho uma coluna chamada Cultura em Cena, transmitida às terças, quintas e sábados) e sou comentarista da artes no Jornal do Meio Dia, da TV Cultura.


Holofote Virtual: Quais as boas novas de 2010?

Carlos C. Santos: Eu e os demais vencedores do III Concurso Literatura para Todos (escritores de São Paulo, Minas, Rio e Brasília) criamos o grupo Autores Atormentados pelo Tucupi (Risos).

Eu lhes apresentei nosso fumegante tacacá e eles, literalmente, piraram (na foto ao lado, o grupo). O tremoço do jambú rendeu elucubrações imensas. Criamos um blog no qual postamos nossas loucuras todas. O endereço é http://bogolatras.blogspot.com/

Outra boa novidade é que minha obra está sendo estudada e debatida por um grupo de mestres e doutores da Universidade Federal de Minas Gerais. Eles têm produzido artigos, organizado minha bio-bibliografia. O trabalho é realizado, na UFMG, pelo Núcleo de Estudos Interdisciplinares da Alteridade (NEIA), ao qual está vinculado o projeto do site Literafro, que abre espaço para a produção de autores brasileiros afro-descendentes.

Holofote Virtual: O que tens aí pronto pra sair do forno?

Carlos C. Santos: Graças a Nossa Senhora de Nazaré, tenho muita, muita coisa. Uma nova peça do projeto de pesquisa em torno da obra de Ismael Nery. Espetáculo, aliás, que foi selecionado para o Festival Breves Cenas de Manaus. Duas peças que começaram a ser montadas, textos que venceram o último edital Claudio Barradas, da Secult. Uma delas se chama “Somos Todos Mulheres Tristes”. Tenho um novo romance já pronto... Ixi, eu tomo açaí desde que nasci. Então, a sustança para escrever é muita (Risos).