segunda-feira, 22 de novembro de 2010

ÓPERA PROFANO VOLTA AO PALCO ENGAJADO A AÇÃO SOCIAL


Metade da bilheteria obtida no primeiro dia da nova temporada do musical será doada ao Comitê Arte pela Vida para tratamento de soropositivos

A idéia de unir provocativamente num mesmo altar travestis, garotos de programa e Nossa Senhora abriu portas para debates e encontrou reações das mais diversas no público. Tudo isso graças ao espetáculo musical “Ópera Profano”. Depois de uma bem sucedida primeira temporada em plena quadra nazarena, a obra criada pelo dramaturgo Carlos Correia Santos e dirigida por Guál Dídimo e Haroldo França volta ao cartaz a partir desta quinta-feira, 25, às 20h, no teatro Margarida Schivasappa, no Centur, e poderá ser vista até o domingo, dia 28. A produção retorna ao palco engajada a uma campanha social. Graças a uma parceria firmada com o Comitê Arte pela Vida, metade da renda obtida com a bilheteria do primeiro dia desta nova temporada será doada a ações de auxílio no tratamento de portadores do HIV. Além do comitê, o espetáculo conta com o apoio de Pink Android, João Ramid, Nelson Borges Make Up, Ponto Zero e Pará Diversidade.

As primeiras apresentações do musical, em outubro, despertaram tanta curiosidade que renderam, em poucas semanas, mais de quatro mil e quinhentas citações no Google e se tornaram um dos assuntos mais comentados por internautas paraenses no Twitter. A repercussão também inspirou o professor e crítico literário Helder Bentes a montar, com alunos da rede pública de ensino, uma versão da peça com cunho pedagógico, adaptada para menores e idealizada para ser apresentada em escolas e eventos estudantis.

CONJUNTURA

O retorno do espetáculo aos holofotes coincide com um período em que vários casos de intolerância contra homossexuais têm sido denunciados na mídia. Para o elenco da montagem, “Ópera Profano” pode servir de ferramenta capaz de manter o debate aceso e auxiliar o público a encarar seus preconceitos. “Acredito que a arte tem o papel fundamental de 'ajudar a ver'. O espetáculo trata com naturalidade de questões que ainda parecem estranhas aos olhos de grande parte da sociedade. Sinto-me feliz de participar de uma iniciativa artística que pode ajudar a mudar isso”, afirma a cantora e atriz Cacau Novais, que vive Nossa Senhora de Nazaré.

Na trama de Carlos Correia Santos, o travesti Tota furta a imagem da Santa antes do início da Trasladação e a leva para um tradicional cinema de filmes pornográficos que, ironicamente, fica bem em frente à Basílica Santuário. Tota quer realizar o sonho de sua colega travesti Baby, que luta, dentro do cinema, contra as complicações decorrentes do HIV e sonha em se aproximar de Nossa Senhora. Também fazem parte do drama o ríspido garoto de programa Lucas, o jovem de classe média Ângelo, o decadente travesti Mira e três misteriosas figuras.

Intérprete de Tota, o ator Dário Jaime acredita que o grande mérito da peça é dar uma perspectiva nova para os dilemas da religiosidade: “Acima de tudo, falamos do sagrado e de como nós nos relacionamos com ele. A maior problemática nesse sentido é que, ainda hoje, as pessoas não respeitam a individualidade, as particularidades de cada um. A sociedade ainda quer padronizar a fé. Tudo o que está fora dos parâmetros ditos aceitáveis é motivo de incomodo e é isso que, pessoalmente, me motiva como cidadão a estar nesse trabalho”.

“O enredo é libertador, provocativo, intenso, reconfortante. Fala de valores tradicionais que poucas vezes questionamos. Impossível não se chocar com a cena em que sombras violentam um personagem. E tem ainda as canções. Versos fortes, doces, sobre a vida e a morte”, explica o ator e cantor Tiago de Pinho, que encarna Ângelo, um estudante que freqüenta o Cine Ópera sem que sua conservadora família suspeite.

O ator Rafael Feitosa não esconde que ficou tenso ao aceitar o convite para participar do musical. “Quando li a obra, tive medo do meu personagem. Faço um garoto de programa chamado Lucas que foi machucado e perdeu toda a fé. Sou de família muito religiosa e a dramaturgia mexeu comigo. Para que se tenha uma idéia, não acho difíceis as cenas de nudez e beijo gay. As cenas mais árduas para mim são aquelas nas quais o Lucas blasfema”.

Responsável por dar corpo ao travesti Mira, o cantor e ator Fábio Tavares defende uma visão humanista: “Minha personagem mostra, acima de tudo, que os travestis são seres humanos. São pessoas que amam, têm suas crenças. Penso que conseguimos fazer a platéia ver que a questão da homossexualidade é simplesmente um segundo plano. Não é determinante para o caráter de ninguém. O foco principal é a fé. Que pode estar em toda e qualquer pessoa”.

Léo Meneses, que faz o personagem Baby, já intuía os frutos que a montagem poderia colher: “Consigo perceber claramente a diferença entre o Léo de antes e de depois desse trabalho. Mas isso não me espanta. Desde a primeira leitura do texto, nós do elenco já tínhamos um indicativo do que o público sentiria. É muito bom estar num projeto que pode auxiliar a humanizar e desembrutecer. Vida longa ao Ópera Profano!”.

Serviço: Ópera Profano – O Musical. De 25 a 28 de novembro, às 20h, no Teatro Margarida Schivasappa, no Centur. Ingressos: R$ 20,00 com meia para estudantes. Apoio: Comitê Arte pela Vida, Pink Android, João Ramid, Nelson Borges Make Up, Ponto Zero e Pará Diversidade. Mais informações em www.operaprofano.com.br

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